domingo, 8 de dezembro de 2019

Despedida



E no meio dessa confusão alguém partiu sem se despedir; foi triste. Se houvesse uma despedida talvez fosse mais triste, talvez tenha sido melhor assim, uma separação como às vezes acontece em um baile de carnaval — uma pessoa se perde da outra, procura-a por um instante e depois adere a qualquer cordão. É melhor para os amantes pensar que a última vez que se encontraram se amaram muito — depois apenas aconteceu que não se encontraram mais. Eles não se despediram, a vida é que os despediu, cada um para seu lado—sem glória nem humilhação.

Creio que será permitido guardar uma leve tristeza, e também uma lembrança boa; que não será proibido confessar que às vezes se tem saudades; nem será odioso dizer que a separação ao mesmo tempo nos traz um inexplicável sentimento de alívio, e de sossego; e um indefinível remorso; e um recôndito despeito.

E que houve momentos perfeitos que passaram, mas não se perderam, porque ficaram em nossa vida; que a lembrança deles nos faz sentir maior a nossa solidão; mas que essa solidão ficou menos infeliz: que importa que uma estrela já esteja morta se ela ainda brilha no fundo de nossa noite e de nosso confuso sonho?

Talvez não mereçamos imaginar que haverá outros verões; se eles vierem, nós os receberemos obedientes como as cigarras e as paineiras — com flores e cantos. O inverno — te lembras — nos maltratou; não havia flores, não havia mar, e fomos sacudidos de um lado para outro como dois bonecos na mão de um titeriteiro inábil.

Ah, talvez valesse a pena dizer que houve um telefonema que não pôde haver; entretanto, é possível que não adiantasse nada. Para que explicações? Esqueçamos as pequenas coisas mortificantes; o silêncio torna tudo menos penoso; lembremos apenas as coisas douradas e digamos apenas a pequena palavra: adeus.

A pequena palavra que se alonga como um canto de cigarra perdido numa tarde de domingo.

Rubem Braga

segunda-feira, 11 de novembro de 2019

Mudar


Quis mudar nessa semana. A caminho de casa ou do trabalho, passei a ouvir musicas que não estou habituado, que fogem do usual para mim. Podcasts ou programas que nunca escuto. Talvez, no fundo, porque sempre gostei desse sentimento discreto de mudança, de ver com outros olhos (no caso, ouvidos) diferentes formas de encarar o mundo e suas idiossincrasias. 

Além disso, creio que este ano aprendi a ser vulnerável. "Vulnerabilidade", uma bela palavra. Devia usá-la mais, ou melhor, praticá-la. Seja vulnerável para se tornar mais forte. 
Apreciar os detalhes, um farol do carro num dia de chuva, um vento forte no fim da tarde, o olhar cativante de alguém feliz prestes ao encontro. Detalhes. 
Algumas coisas você somente percebe quando se estar vulnerável. 

Mudar custa pouco e te leva longe.


terça-feira, 3 de setembro de 2019

Onde vivem os monstros



Esse filme é uma adaptação de um livro feita por Spike Jonze. Acabou se tornando uma historia indie-infantil para adultos. É uma grande metáfora dos sentimentos de uma criança e seu crescimento, amadurecimento. Quanto ao enredo, conta a historia do garoto Max que, após ser colocado de castigo pela mãe, foge de casa vestido de lobo e acaba chegando a uma ilha habitada por criaturas.

Há uma constante dúvida se o garoto fugiu de fato e encontrou esse lugar mágico ou se tudo era fruto de sua imaginação. Sendo imaginação, os monstros representavam sentimentos do garoto ou as pessoas próximas a ele? Um desses monstros, Carol, dublado magistralmente por James Gandolfini (Os Sopranos), representa bem essa dualidade entre solidão e ira, sentimentos contidos no próprio Max. De cara, Carol se torna o monstro predileto dele.

Spike Jonze trata o filme como uma fábula, quase um conto infantil. A fotografia de Lance Acord é magistral e sabe jogar bem com a luz natural do sol e as sombras da floresta. Os monstros são reais, com exceção das expressões faciais que são feitas via computação gráfica. Por fim, podemos dizer que Onde moram os monstros é um filme esquisito, diferente. Sua mensagem é relativa e pode ser interpretada por diversos ângulos. Provável que essa era a intenção do diretor. Não há moral da história, mas sim um fluxo de emoções sentidas entre aquele garoto e seus amigos monstros, no único lugar que ele se sentia bem, como um verdadeiro rei.

segunda-feira, 19 de agosto de 2019

Sociedade dos Poetas Mortos



Sociedade dos Poetas Mortos (1990) é um clássico. Esse filme do Peter Weir, mesmo diretor de o Show de Truman, é um lindo ensinamento sobre educação e a vida no geral. Nele, vemos o professor John Keating, carinhosamente interpretado por Robin Williams (no auge da carreira), ensinando poesia e literatura numa escola tradicional e conservadora para garotos. No entanto, Keating vai além. Ele destoa dos demais professores por ensinar aos meninos sobre o livre pensamento, a terem autoconfiança e encontrarem sua própria voz.

Em certo momento, eles descobrem que o professor participava em sua juventude de algo chamado sociedade dos poetas mortos. Um grupo de meninos que se encontravam em uma caverna nos arredores da escola à noite para declamarem poemas e discutirem livremente acerca da vida, longe das rédeas morais do colégio. Assim, eles recriam essa sociedade e fazem seus encontros.  Cada um, a sua maneira, acaba por descobrir suas próprias vontades, como, declarar-se a uma garota, desafiar a vontade dos pais ou até entrar para uma peça de teatro.

O filme é cheio de citações de autores famosos, o que serve de enredo para a descoberta das vozes desses estudantes. Para Keating, longe das amarras familiares, a escola deveria ser o local para que os garotos pudessem encontrar suas vontades e se descobrirem como pessoas que possuem pensamentos próprios. Isso torna esse filme atemporal e magnífico. Ao ensinar sobre o poder dos sentimentos das palavras e de como devemos aproveitar nosso dia, o professor acaba por definir bem o sentido da frase mais famosa desse filme e que deveria guiar a maioria das pessoas: Carpe Diem.

segunda-feira, 5 de agosto de 2019

Agentes do Destino



Será que existe destino ou somos manipulados sem que percebamos? Agentes do Destino (2011) conta a história do candidato a Senador David Norris (Matt Damon) que, após perder a eleição, conhece por acaso, num banheiro, a bailarina Elise (Emily Blunt). A espontaneidade dela o inspira a fazer um belo discurso que acaba salvando sua carreira política. Naquele instante eles se apaixonam. No entanto, em outro núcleo da trama, vemos agentes planejando para que um deles derrame café do David para que ele perca o ônibus e, assim, não reencontre Elise, já que para esses agentes, os dois não podem ficar juntos, uma vez que isso prejudicaria o “plano”.

Entretanto, o agente Harry (Anthony Mackie) dorme e David acaba reencontrando Elise, e, logo após, o congressista acaba vendo seu amigo sendo “recalibrado”, o que faz com que ele descubra que existem agentes do destino, que manipulam e fazem com que as pessoas sigam suas vidas de acordo com um certo plano, escrito por quem eles chamam de “Presidente”. Os agentes justificam sua atuação dizendo que quando eles se afastaram e deixaram os homens livres para controlarem seu destino, a humanidade viveu seus piores momentos, como na Idade Média ou durante as guerras mundiais. Ainda diz que se David ficar com Elise os sonhos dos dois nunca se realização. Apesar dos avisos e preocupações, David começa a corrida para manter Elise em sua vida e assim salvar seu amor, mesmo que ele tenha que enfrentar esses agentes.

Esse longa do George Nolfi traz o questionamento se há outras pessoas – ou "divindades" – que controlam nosso destino, dando a impressão que temos poder sobre nossa própria trajetória de vida, mas que, na realidade, não temos. Será que nosso destino já está escrito ou podemos modificá-lo? Qual o poder do acaso? É um filme que, intercalado a cenas de ação e romance, coloca-nos essa reflexão, e, por isso, vale muito a pena.

quinta-feira, 25 de julho de 2019

Objetos esquecidos


Quando deixamos de usar certos objetos? Quando não há mais utilidade ou simplesmente quando não os queremos mais? Talvez os dois. Uma calça jeans, uma camisa listrada, uma pulseira ou um livro comprado e nunca lido, esquecido entre garrafas de vinho na estante empoeirada. A matéria também tem vida em sua utilidade.

Há espaço para tudo quando sabe-se priorizar. Escolher o tempo certo é mais importante do que o objeto correto. A intangibilidade produzida por um presente recebido (ou doado) não tem preço e, enquanto tiver valor, não há descartabilidade. Não há desprezo pela velha bola de tenis enquanto ainda se quer jogá-la na parede. Não se joga fora uma garrafa enquanto ainda te faz lembrar da noite que a abriu e bebeu com alguém especial.

O sentido existe porque você o cria, nomeia-o e o guarda em seu coração. Uma vez ouvi que se te faz sentir, então faz sentido. Logo, se você abraça o significado, então nunca irá perder seu real valor. Há mais memória na vida do que se imagina.

quarta-feira, 10 de julho de 2019

Meia Noite em Paris



Meia Noite em Paris é uma obra prima do Woody Allen, que escreve e dirige o filme. No longa, acompanhamos a viagem que Gil Pender (Owen Wilson), roteirista de Hollywood, com sua noiva Inez (Rachel McAdams) a Paris. Ele faz vários passeios noturnos e, a meia-noite, ele é transportado para Paris dos anos 20, melhor época para ele. Gil é nostálgico e sempre quis viver nessa época. Nessas viagens, ele conhece seus ídolos, como escritores e pintores. A partir daí ele passa a questionar as escolhas pessoais e profissionais de sua vida.

Ele percebe, por exemplo, que sua noiva é totalmente diferente dele, que possuem gostos diversos e que ela, por vezes, não respeita suas escolhas. Percebe, também, que poderia ter se tornado um escritor de romances, sonho que sempre possuiu, mas nunca realizou. Na década de 20, ele conhece e se apaixona por Adriana (Marion Cotillard), que namorava Pablo Picasso à época. Juntos eles viajam para La Belle Epoque da França - final do séc. XIX - percebendo ali que a “melhor época” para se viver sempre será diferente para cada pessoa e que no fundo nunca valorizamos nosso presente.

Woody Allen ganhou o Oscar de melhor roteiro original com esse filme. Creio que, além da bela fotografia que acompanha toda sua cinematografia, esse filme funciona bem como um alívio dramático para o tema da nostalgia. Afinal, quem nunca quis viver na época de seus ídolos ou quis ter nascido em outro período? Ou ainda, quem nunca quis ter outra carreira profissional ou ter feito outras escolhas na vida pessoal? Tanto pelo drama como pelo enredo, Meia Noite em Paris funciona bem como se fosse um romance em formato de filme.  

segunda-feira, 1 de julho de 2019

50/50



50/50 é um bom filme do cinema indie americano. Quase esquecido pelo público geral uma vez que foi lançado apenas nas locadoras, ele rende boas risadas e também emociona. Escrito por Will Reise, conta a sua história de como enfrentou o câncer. Nesse longa, vemos Adam (Joseph Gordon-Levitt), rapaz de 27 anos que descobre que possui um câncer na coluna e tem 50% de chances de sobreviver. Vemos o enfrentamento da doença ao lado de seu amigo Kyle (Seth Rogen), da namorada Rachel (Bryce Dallas Howard) e sua família.

O tema do câncer é tratado de forma delicada, sensível e realista. Por exemplo, assim como mostra os efeitos das sessões de quimioterapia, por outro lado vemos os laços de amizades e amor entre os personagens. Exceto em relação a Rachel, já que ela demonstra seu desconforto ao estar ao lado de Adam, indicando um provável fim de relacionamento. Kyle, por sua vez, funciona bem como alívio cômico e traz leveza e alegria para o enredo. Ademais, destaco o papel da Anna Kendrick como a psicóloga iniciante de Adam, numa atuação doce e alegre. Por fim, a relação de Adam e sua mãe é um dos pontos altos do filme e que merece atenção ao assisti-lo.

50/50 é um filme que, muito além de retratar sobre uma doença, expõe bem seus efeitos na família e amigos. Joseph Gordon-levitt mostra como sabe fazer drama, deixando de lado seu papeis como coadjuvante e trazendo realismo como protagonista. Ah, a cena dele raspando a cabeça é boa e divertida, assim como ele com os pais antes de ir fazer a cirurgia. Logo, seja para rir ou chorar, esse filme funciona muito bem.

segunda-feira, 17 de junho de 2019

Jerry Maguire



Em Jerry Maguire – A grande virada (1996), vemos a história de um agente esportivo (Tom Cruise) em busca de sucesso, mas o filme vai muito além disso. Jerry é um personagem arrogante e ganancioso, inclusive o filme começa com seu nome dentro da imagem do planeta terra, o que representa bem seu ego. No entanto, após visitar um cliente machucado no hospital ele percebe sua frieza para com os outros e como a indústria do esporte desumaniza os atletas, assim, visando mudar isso, ele cria uma espécie de manual para que a empresa trate melhor seus clientes. A idéia não dá certo e ele é demitido, conseguindo salvar apenas um cliente ao seu lado, o jogador de futebol americano Rod (Cuba Gooding Jr.) e a doce secretária Dorothy (Renée Zellweger).

Após a demissão ele vai em busca de criar sua própria empresa de agenciamento - mesmo tendo apenas um cliente - e mudar seu estilo de vida. De um agente frenético por dinheiro para um personagem que fica feliz em cantar música dentro do carro. O filme muda seu jeito de filmar, retira cortes rápidos e, aos poucos, sai da figura do Jerry para suas relações tanto com Rod quanto com Dorothy e sua família. O foco não é mais o mundo esportivo e sim a grande virada na vida do protagonista em se tornar uma pessoa melhor.

Os filmes do Cameron Crowe sempre têm uma temática: o ser humano e sua relações. Jerry Maguire tornou-se um clássico desse diretor. Não trata apenas da competitividade das empresas esportivas, mas da evolução de um personagem e em como podemos mudar nossa vida e sermos pessoas íntegras e empáticas com as pessoas e suas nuances.

terça-feira, 28 de maio de 2019

A vida secreta de Walter Mitty



Remake de O homem de 8 vidas (1947), A vida secreta de Walter Mitty (2013) trata sobre mudança de vida e como sair da inércia e começar a agir e a viver. Ben Stiller tem uma direção memorável e mostra ser um bom diretor motivacional nesse longa-metragem.

Stiller faz o papel de Walter Mitty, homem pacato e funcionário da lendária revista LIFE. Ele revela negativos para as publicações da capa da revista. Um dia, o fotógrafo selvagem interpretado por Sean Penn envia os últimos negativos - já que a revista impressa será fechada dando lugar a online - porém falta o negativo número 25, justamente a foto que será a capa final da revista.

Assim, Mitty, motivado a encontrar esse negativo, sai em busca de Sean, indo em uma aventura que passa pela Groelândia, Islândia e nas montanhas do Afeganistão. O filme intercala momentos de devaneios e fantasia do protagonista com a real corrida dele em busca da fotografia perdida. O longa ganha ao utilizar cenários reais, como as cenas na Islândia, o que dá ao filme uma ótima fotografia e edição de imagens.

Walter Mitty representa bem aqueles momentos em que nos perdemos em sonhos acordados ou idealizamos muito em como seria nossa vida se fossemos de outro jeito, seguros, aventureiros, reconhecidos no trabalho e com o amor de nossas vidas ao nosso lado. No entanto, o filme deixa claro que Mitty não era só um homem desinteressante e sem qualidades, ao contrário, ele tinha objetivos. Por exemplo, quando reencontra uma mochila antiga de camping quando sonhava em viajar a Europa, ou quando ele mostra que sabe andar bem de longboard. Coisas que foram esquecidas por ele próprio e sufocadas pela rotina do cotidiano.

Por fim, o filme diverte e motiva. Contribui com aqueles que sempre quiseram fazer algo a mais ou que se veem estagnados na vida. É um filme que surgiu sem grandes pretensões, mas que fica guardado com carinho por aqueles que se identificaram com o enredo e com o lema da revista LIFE: “Ver o mundo e seus perigos. Ver por trás dos muros. Chegar mais perto. Encontrar o outro e sentir. Esse é o propósito da vida.”

quarta-feira, 8 de maio de 2019

Hora de voltar



Hora de voltar (Garden State, 2004) é um drama cômico realista e independente escrito, dirigido e estrelado por Zach Braff, mais conhecido pela série Scrubs. No filme, Andrew Largeman (Braff) é um ator e garçom sem muitas emoções na vida e entediado que mora sozinho há muitos anos em Los Angeles. Ele tem que retornar à sua cidade pois sua mãe faleceu. Ele não quer voltar e encarar seu passado já que desde criança toma remédios psiquiátricos receitados por seu próprio pai e sente-se culpado por ter derrubado sua mãe, que ficou paraplégica.

Ao retornar, ele reencontra antigos amigos e conhece uma nova garota, a alegre e engenhosa Sam (Natalie Portman). A partir daí, ele visita lugares junto à Sam e seu amigo Mark (Peter Sarsgaard). O filme é sensível e funciona como uma viagem no tempo, principalmente para aqueles que saíram de casa e agora retornam, cheios de lembranças e nostalgias.

Andrew, aos poucos, aprende a enfrentar seus medos e, com a ajuda dos amigos, percebe que pode novamente aprender a ser alguém livre de vícios e até a encontrar um novo amor. Deixa de estar entorpecido para ser alguém com sonhos e que busca um futuro diferente, longe de seus traumas. O filme mostra que às vezes para se viver melhor é importante voltar para aprender a perdoar e, assim, recomeçar.

Por fim (e não menos importante), o filme tem uma ótima trilha sonora!

terça-feira, 30 de abril de 2019

Alta fidelidade


"O que veio primeiro, a música ou a tristeza? Eu ouço música pop porque sou infeliz? Ou sou infeliz porque ouço música pop?" É assim que inicia o filme Alta fidelidade, baseado no livro homônimo de Nick  Hornby. Esse é um dos questionamentos que o inseguro Rob Gordon tem durante o filme.

Rob (John Cusack) tem 35 anos e é dono de uma loja de discos em um bairro sem muitos clientes. Ele tem como únicos amigos seus dois curiosos funcionários, Barry e Dick. Após sua namorada Laura terminar o namoro e sair de casa, Rob conclui que há algo de errado com ele e, para tentar entender sua vida amorosa, elenca os cincos piores términos de relacionamentos que teve na vida: Alison, Penny, Jackie, Sarah e Charlie. Por orgulho - e certo rancor - ele não coloca na lista a Laura, seu término mais recente, apesar de percebermos que ele ama ela. Falando em listas, o filme é cheio delas, o que deixa a narrativa leve e dinâmica. Ele e seus amigos constantemente fazem listas como "Top Five músicas sobre a morte" ou "cinco melhores discos de todos os tempos". Tudo sempre relacionado à música, é claro.

O filme usa bem a técnica de break the fourth wall (quebra da quarta parede), pois o Rob fala diretamente com o público, contando seus pensamentos e inseguranças para a gente que está assistindo ao filme. Lembrando que essa técnica é bastante usada em "Curtindo a vida adoidado" (1986), "Clube da luta" (1999), "O senhor das armas" (2005) e na série "House of Cards" (2013), o que nos deixa presos ao roteiro e sabendo exatamente o que ele pensa sobre certa cena.

Então, ele visita suas ex-namoradas para entender o que fez de errado para merecer ser rejeitado em todos os seus casos anteriores, buscando um sentido para sua vida, ao mesmo tempo em que conhece uma charmosa cantora e inicia um relacionamento novo. A partir desse ponto, só assistindo para evitar spoiler (rs).

O filme é repleto de referencia pop e é bem fiel ao livro, que aproveito e indico também, até por que ao ler o livro você consegue descobrir várias bandas e músicas que os personagens citam em suas listas. Assim, quem gosta de música, lembra das locadoras (aqui, no caso, loja de discos) e tem muitas dúvidas em seus relacionamentos, esse filme vai cair como uma luva. Além de ser divertido é, apesar de ser de 2000, a cara dos anos 90.

Let´s get it on!

quarta-feira, 24 de abril de 2019

O Estado das Coisas



O Estado das Coisas (Brad´s status), de 2017, escrito e dirigido pelo Mike White, diretor de “Escola do Rock” e “Nacho libre”, é um daqueles filmes simples, de baixo orçamento, que devemos reconhecer como importantes para refletirmos sobre a vida. Brad, interpretado pelo Ben Stiller (em sua melhor interpretação dramática), vive um homem perto dos 50 anos, com uma vida comum, casa, esposa e filho, este prestes a entrar numa faculdade. De repente, ele se vê numa crise pessoal, questionando as escolhas que fez na vida e se comparando com antigos amigos da faculdade, que se tornaram ricos e bem sucedidos. Então, ele parte para Boston para acompanhar a entrevista do filho em uma universidade.

Brad é melancólico, algo perceptível em alguém que está frustrado e insatisfeito com a própria vida. Antes e durante a viagem ele se perde em seus pensamentos, pensando em como seria a vida se fosse solteiro ou se tivesse seguido outra carreira profissional, por vezes, até devaneia trocando de vida com o próprio filho, que aparentemente terá uma carreira e experiência universitária melhor que a dele. A crise de meia idade de Brad o consome, mas é bem comum e ganha força nos tempos atuais, em que vivemos sob a égide das redes sociais, onde podemos publicar - e muitas vezes comparar - nossas vidas com a de amigos ou familiares, infelizmente.

Entretanto, vemos o amor dele pelo filho, e, apesar das comparações feitas, ele percebe, aos poucos, a importância dele na vida de sua própria família e como ele conseguiu criar um “ser humano maravilhoso”. O filme é realista e sensível, tocando em temas atuais, como o fato de vivermos pressionados para sermos perfeitos, termos uma bela carreira profissional e uma vida social glamurosa, ou ao menos aparentar isso para o mundo.

Em “O Estado das Coisas”, vemos muito além da relação entre pai e filho, aprendemos, também, a valorizar o que construímos e em nunca perder o interesse pela vida, seja qual for o caminho traçado, pois, como deduz o protagonista, nós ainda podemos amar o mundo sem ter que possuí-lo.

terça-feira, 16 de abril de 2019

After life



A nova série After Life, da Netflix, escrita e dirigida por Ricky Gervais, traz uma perspectiva realista e esperançosa acerca da depressão. Após a morte de sua mulher, por um câncer de mama, Tony (Gervais) fica deprimido e amargurado, além de desenvolver pensamentos suicidas. Ele passa a tratar a todos da maneira que lhe convém, mesmo que isso signifique falar mal de idosas na rua ou ameaçar uma criança de 10 anos com um martelo, tudo com muito sarcasmo e ironia – nessas horas lembramos do humor que o consagrou como David Brent, em “The Office”. Sua vida se resume em uma rotina melancólica e trocas de ofensas com pessoas aleatórias, atitudes bem diferentes de sua personalidade alegre e divertida de outrora, quando tinha a companhia de sua esposa.

A série mostra um lado bem comum da depressão, mostrando a insatisfação e tristeza de alguém que acaba de perder o amor de sua vida. No entanto, a série deixa claro que, apesar da vontade de se matar, ele não o fez. Com o pretexto de cuidar da cadela Brandy, vemos que o Tony, no fundo, não desistiu da própria vida. Os planos de filmagem da série, que sempre é filmada durante o dia - normalmente ensolarado e em belos lugares, como parques e praia – corroboram com essa visão otimista, deixando a entender que há esperança para ele, o que contrasta com o humor deprimido do personagem que sempre veste cores escuras.

Com o tempo e as interações com os outros ao seu redor, ele percebe que há coisas boas para celebrar e visualiza que tem pessoas que querem seu bem. A trilha sonora vai mudando à medida que ele vai percebendo a importância dos momentos comuns em sua vida, como aproveitar a companhia dos colegas de trabalho, as novas amizades no bairro e até a possível descoberta de um (novo) amor.

Coisas boas acontecem com pessoas ruins, e coisas ruins acontecem com pessoas boas. É a vida. Ponto.” Diz uma personagem. Isso resume bem como devemos enfrentar as mais diversas circunstancias na vida e como devemos aprender a ver o quanto nós contribuímos para o nosso pequeno pedaço de mundo. Assim é After Life.