domingo, 30 de maio de 2021

Aquele velho


Aquele velho já foi uma criança inteligente, um jovem entusiasmado, um adulto organizado, um pai parceiro e um avô carinhoso, mas nunca deixou de ser o passado que insistiu em reviver. Naquela velha cadeira na varanda, perto do mar, ele lia papéis velhos, amassados e corroídos pelo tempo, porém, com algum esforço, conseguia sentir o cheiro do perfume do dia em que se conheceram, no gosto da cerveja gelada num bar que já foi fechado, numa cidade que já não mora mais. O choro não é um sentimento ou um ato, mas um samba antigo que se repete nas suas memórias de juventude. Quando perguntado pelo neto no que sempre estava pensando, aquele velho respondia: “No lugar que um dia foi meu, para onde fujo, onde ninguém irá me encontrar. Nas minhas lembranças.” A palavra ‘saudade’ só existe no português e para aquele velho, era como um poeta sozinho em uma ilha, uma flor esquecida no concreto, a marca de batom num copo já vazio. Um amor que nunca acabou, lembranças jamais esquecidas.