terça-feira, 30 de abril de 2019

Alta fidelidade


"O que veio primeiro, a música ou a tristeza? Eu ouço música pop porque sou infeliz? Ou sou infeliz porque ouço música pop?" É assim que inicia o filme Alta fidelidade, baseado no livro homônimo de Nick  Hornby. Esse é um dos questionamentos que o inseguro Rob Gordon tem durante o filme.

Rob (John Cusack) tem 35 anos e é dono de uma loja de discos em um bairro sem muitos clientes. Ele tem como únicos amigos seus dois curiosos funcionários, Barry e Dick. Após sua namorada Laura terminar o namoro e sair de casa, Rob conclui que há algo de errado com ele e, para tentar entender sua vida amorosa, elenca os cincos piores términos de relacionamentos que teve na vida: Alison, Penny, Jackie, Sarah e Charlie. Por orgulho - e certo rancor - ele não coloca na lista a Laura, seu término mais recente, apesar de percebermos que ele ama ela. Falando em listas, o filme é cheio delas, o que deixa a narrativa leve e dinâmica. Ele e seus amigos constantemente fazem listas como "Top Five músicas sobre a morte" ou "cinco melhores discos de todos os tempos". Tudo sempre relacionado à música, é claro.

O filme usa bem a técnica de break the fourth wall (quebra da quarta parede), pois o Rob fala diretamente com o público, contando seus pensamentos e inseguranças para a gente que está assistindo ao filme. Lembrando que essa técnica é bastante usada em "Curtindo a vida adoidado" (1986), "Clube da luta" (1999), "O senhor das armas" (2005) e na série "House of Cards" (2013), o que nos deixa presos ao roteiro e sabendo exatamente o que ele pensa sobre certa cena.

Então, ele visita suas ex-namoradas para entender o que fez de errado para merecer ser rejeitado em todos os seus casos anteriores, buscando um sentido para sua vida, ao mesmo tempo em que conhece uma charmosa cantora e inicia um relacionamento novo. A partir desse ponto, só assistindo para evitar spoiler (rs).

O filme é repleto de referencia pop e é bem fiel ao livro, que aproveito e indico também, até por que ao ler o livro você consegue descobrir várias bandas e músicas que os personagens citam em suas listas. Assim, quem gosta de música, lembra das locadoras (aqui, no caso, loja de discos) e tem muitas dúvidas em seus relacionamentos, esse filme vai cair como uma luva. Além de ser divertido é, apesar de ser de 2000, a cara dos anos 90.

Let´s get it on!

quarta-feira, 24 de abril de 2019

O Estado das Coisas



O Estado das Coisas (Brad´s status), de 2017, escrito e dirigido pelo Mike White, diretor de “Escola do Rock” e “Nacho libre”, é um daqueles filmes simples, de baixo orçamento, que devemos reconhecer como importantes para refletirmos sobre a vida. Brad, interpretado pelo Ben Stiller (em sua melhor interpretação dramática), vive um homem perto dos 50 anos, com uma vida comum, casa, esposa e filho, este prestes a entrar numa faculdade. De repente, ele se vê numa crise pessoal, questionando as escolhas que fez na vida e se comparando com antigos amigos da faculdade, que se tornaram ricos e bem sucedidos. Então, ele parte para Boston para acompanhar a entrevista do filho em uma universidade.

Brad é melancólico, algo perceptível em alguém que está frustrado e insatisfeito com a própria vida. Antes e durante a viagem ele se perde em seus pensamentos, pensando em como seria a vida se fosse solteiro ou se tivesse seguido outra carreira profissional, por vezes, até devaneia trocando de vida com o próprio filho, que aparentemente terá uma carreira e experiência universitária melhor que a dele. A crise de meia idade de Brad o consome, mas é bem comum e ganha força nos tempos atuais, em que vivemos sob a égide das redes sociais, onde podemos publicar - e muitas vezes comparar - nossas vidas com a de amigos ou familiares, infelizmente.

Entretanto, vemos o amor dele pelo filho, e, apesar das comparações feitas, ele percebe, aos poucos, a importância dele na vida de sua própria família e como ele conseguiu criar um “ser humano maravilhoso”. O filme é realista e sensível, tocando em temas atuais, como o fato de vivermos pressionados para sermos perfeitos, termos uma bela carreira profissional e uma vida social glamurosa, ou ao menos aparentar isso para o mundo.

Em “O Estado das Coisas”, vemos muito além da relação entre pai e filho, aprendemos, também, a valorizar o que construímos e em nunca perder o interesse pela vida, seja qual for o caminho traçado, pois, como deduz o protagonista, nós ainda podemos amar o mundo sem ter que possuí-lo.

terça-feira, 16 de abril de 2019

After life



A nova série After Life, da Netflix, escrita e dirigida por Ricky Gervais, traz uma perspectiva realista e esperançosa acerca da depressão. Após a morte de sua mulher, por um câncer de mama, Tony (Gervais) fica deprimido e amargurado, além de desenvolver pensamentos suicidas. Ele passa a tratar a todos da maneira que lhe convém, mesmo que isso signifique falar mal de idosas na rua ou ameaçar uma criança de 10 anos com um martelo, tudo com muito sarcasmo e ironia – nessas horas lembramos do humor que o consagrou como David Brent, em “The Office”. Sua vida se resume em uma rotina melancólica e trocas de ofensas com pessoas aleatórias, atitudes bem diferentes de sua personalidade alegre e divertida de outrora, quando tinha a companhia de sua esposa.

A série mostra um lado bem comum da depressão, mostrando a insatisfação e tristeza de alguém que acaba de perder o amor de sua vida. No entanto, a série deixa claro que, apesar da vontade de se matar, ele não o fez. Com o pretexto de cuidar da cadela Brandy, vemos que o Tony, no fundo, não desistiu da própria vida. Os planos de filmagem da série, que sempre é filmada durante o dia - normalmente ensolarado e em belos lugares, como parques e praia – corroboram com essa visão otimista, deixando a entender que há esperança para ele, o que contrasta com o humor deprimido do personagem que sempre veste cores escuras.

Com o tempo e as interações com os outros ao seu redor, ele percebe que há coisas boas para celebrar e visualiza que tem pessoas que querem seu bem. A trilha sonora vai mudando à medida que ele vai percebendo a importância dos momentos comuns em sua vida, como aproveitar a companhia dos colegas de trabalho, as novas amizades no bairro e até a possível descoberta de um (novo) amor.

Coisas boas acontecem com pessoas ruins, e coisas ruins acontecem com pessoas boas. É a vida. Ponto.” Diz uma personagem. Isso resume bem como devemos enfrentar as mais diversas circunstancias na vida e como devemos aprender a ver o quanto nós contribuímos para o nosso pequeno pedaço de mundo. Assim é After Life.