Sou de “esquerda” e apoio as intervenções
governamentais na economia feitas pelo Governo nos últimos anos, mas achei inédito
– pra não dizer estranho – a demanda pela diminuição da meta fiscal deste ano.
A meta de resultado fiscal, que visa a obter o superávit primário (SP), não
será cumprida pelo Governo. Isto é um fato. Na conta do SP, das receitas
primárias subtraem-se as despesas também primarias, ou seja, recebimentos e
gastos não financeiros. No momento, o Governo quer alterar o cálculo do
superávit (indicador de cumprimento fiscal na LRF) via um projeto de lei que
altera a LDO para retirar do cálculo despesas com o PAC e desonerações fiscais,
assim cumpriria a meta que ficaria em 10 bilhões (hoje a meta é de 81 bilhões).
Apenas lembrando que a finalidade desta “sobra” é pagar os juros da dívida do país.
Bem, o problema é que as despesas
que serão retiradas e baixarão a meta são despesas PRIMÁRIAS, obras e tributos,
assim, devem constar do cálculo. Com isso, o país revela, ao baixar a base de
cálculo, que não tem condições (ou comprometimento) em pagar os juros da
dívida, tampouco amortizar o principal dela. Países estrangeiros, observantes,
tenderão a aumentar os juros de suas transações com o país (pois o risco é
maior) e, em provável escala, diminuirão seus investimentos nos títulos públicos
brasileiros. De qualquer maneira, o Governo deverá
rever medidas de contenção de custos e em outros gastos como no
seguro-desemprego e pensões, por exemplo.
Bem, essa é minha visão ampla, no
entanto, vejo que pagar dívida pública e juros nunca foi (e nem deveria ser) a
maior prioridade no país. Você na sua casa odeia ter que pagar juros do cartão,
né? ...mas isso é inerente do sistema financeiro e nunca impediu de você
realizar sua compra – às vezes recorrendo a uma operação de crédito
(empréstimo) – para aumentar os bens de sua casa. Há dívidas, mas há aumento do
seu “PIB” domiciliar.
O Brasil, nos últimos anos,
mostrou-se bom pagador e local benfazejo para investimentos. O PIB cresceu na década
presente e a economia não “baixou a guarda” frente a uma crise européia. Para
mim, retirar certos gastos para assegurar o cumprimento do plano de governo e,
com isso, os projetos sociais, é uma atitude coerente e corajosa, apesar de ser
desrespeitosa para com as normas da LRF. Aguardaremos as medidas.
Há uma série de questões a serem discutidas a respeito, mas me limito às observações abaixo:
ResponderExcluir1. Mesmo incluindo desonerações e investimentos do PAC na conta, a situação fiscal brasileira é melhor do que a de Índia, Japão, Espanha, Reino Unido, EUA e outros;
2. Uma coisa é a economia da dona de casa; outra, completamente diferente, é a macroeconomia. Macroeconomia não é economia doméstica transplantada para um páis. A ideia de que não se deve gastar mais do que se arrecada funciona pra mim, pra você, pra dona Maria. Se esta ideia fosse aplicada à coletividade, estaríamos todos mortos;
3. O que determina a compra de títulos públicos brasileiros por parte de estrangeiros e nacionais é o diferencial entre a SELIC e as alternativas à ela. Ainda que derrubem a SELIC, a taxa brasileira permanecerá entre as maiores remunerações financeiras do globo. A alteração na LRF, portanto, pouco ou nada influenciará a decisão do especulador interno e externo em comprar títulos brasileiros;
4. A maioria dos países financia dívida com mais dívida. Isto é administrável. Se houver déficit primário por um tempo, não há problema desde que preservados emprego e atividade econômica. O indicador mais apropriado para se monitorar esse quadro é a relação DÉFICIT / PIB e DÍVIDA / PIB.
5. Ao contrário do que se aplica em economia doméstica, cortar gasto corrente pode aumentar o déficit, uma vez que a redução da atividade provoca corrosão na receita tributária.
Por enquanto é isso, meu camarada.